O Relatório sobre a Situação Mundial da População 2023, intitulado “8 Mil Milhões de Vidas, Possibilidades Infinitas. Assegurando Direitos e Escolhas.”, do Fundo das Nações Unidas para a População (FNUAP), foi apresentado esta quinta-feira, dia 19 de abril, na Assembleia da República.
A convite do Grupo Parlamentar Português sobre População e Desenvolvimento da Assembleia da República, a Médicos do Mundo esteve presente neste lançamento, que contou com a participação e as intervenções de vários convidados e parlamentares.
O relatório aponta para novos dados que revelam preocupações demográficas generalizadas e a crescente adoção pelos governos de políticas destinadas a aumentar, reduzir ou manter taxas de fertilidade. Contudo estes esforços são muitas vezes ineficazes e podem corroer os direitos das mulheres.
Repensar a forma de abordar os números
O relatório do Fundo das Nações Unidas apela a que seja totalmente repensada a forma como são abordados os dados demográficos, exortando os políticos e os órgãos de comunicação social a abandonarem as narrativas exageradas sobre os aumentos e diminuições da população. Sugere-se que, em vez de se questionar a velocidade a que as pessoas se reproduzem, seja avaliado se os indivíduos, sobretudo as mulheres, são capazes de fazer livremente as suas próprias escolhas reprodutivas.
Tal como salientou Mónica Ferro, diretora do Escritório do Fundo das Nações Unidas para a População, em Genebra, durante a apresentação do relatório, é essencial que os corpos das mulheres não fiquem reféns das políticas demográficas e que seja repensada a forma como se aborda e planeia as alterações populacionais.
É surpreendente que 44% das mulheres e raparigas com parceiros, em 68 dos países que participaram no relatório, não têm o direito de tomar decisões informadas sobre os seus corpos, quando se trata de ter relações sexuais, utilizar métodos contracetivos e procurar cuidados de saúde. Estima-se ainda que 257 milhões de mulheres em todo o mundo têm uma necessidade não satisfeita de métodos contracetivos seguros e fiáveis.
Controlo demográfico e violação dos direitos humanos
As políticas de fertilidade centradas na redução das taxas de natalidade são muitas das vezes ineficazes e podem minar os direitos das mulheres. Muitos países lançaram programas para incentivar famílias maiores, oferecendo incentivos financeiros e recompensas às mulheres e aos seus parceiros, mas as taxas de natalidade continuam abaixo de dois filhos por mulher. Por outro lado, os esforços para abrandar o crescimento populacional, através da esterilização forçada e contraceção coerciva têm sido uma violação grosseira dos direitos humanos.
No âmbito deste relatório, sublinha-se que o planeamento familiar não deve ser utilizado com instrumento para atingir objetivos de fertilidade, mas sim para capacitar os indivíduos. As mulheres devem poder escolher se querem ter filhos, quando e quantos, livres de qualquer coerção de especialistas e responsáveis públicos.
Neste sentido, o relatório recomenda que os governos implementem políticas baseadas nos direitos e na igualdade de género, tais como programas de licença parental, créditos fiscais para crianças, políticas que promovam a igualdade de género nos locais de trabalho e o acesso universal à saúde sexual e reprodutiva.
Principais factos e números da Situação Mundial da População 2023
- 24% das mulheres e raparigas que têm parceiros são incapazes de dizer não ao sexo e 11% incapaz de tomar decisões especificamente sobre contraceção, de acordo com os dados dos 68 países participantes.
- Um inquérito em oito países mostrou que as pessoas que tinham sido expostas aos meios de comunicação ou a conversas sobre a população mundial, tinham mais probabilidades de a ver como sendo demasiado elevada.
- A demografia global está a mudar rapidamente: dois terços das pessoas vivem em contextos de baixa fertilidade, enquanto apenas oito países serão responsáveis por metade do crescimento demográfico previsto até 2050 (República Democrática do Congo, Egito, Etiópia, Índia, Nigéria, Paquistão, Filipinas e República Unida da Tanzânia), reordenando o ranking mundial dos países mais populosos.
- Culpar a fertilidade pelas alterações climáticas não vai responsabilizar os maiores emissores de carbono. Dos 8 mil milhões de pessoas, cerca de 5,5 mil milhões não ganham dinheiro suficiente, cerca de 10 dólares por dia, para contribuir significativamente para as emissões de carbono.
- Um estudo recente das Nações Unidas refere que uma maior paridade de género na força de trabalho teria maior impacto na sustentabilidade de economias de sociedades envelhecidas e de baixa fertilidade, do que estabelecer metas para que as mulheres tenham mais filhos.