O Relatório Mundial sobre Drogas de 2023, da Agência das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), identificou a necessidade de iniciativas internacionais de prevenção do uso de drogas em grande escala.
Neste âmbito, em junho de 2023, especialistas de vários países reuniram-se em Oviedo, Espanha, com vista a explorar estratégias eficazes de prevenção do consumo de drogas, alinhadas com as melhores orientações científicas.
Em resultado do encontro, a 1 de janeiro de 2024, foi adotada a Declaração de Oviedo, para reforçar o papel da prevenção nas políticas de drogas.
Até final de outubro de 2024, mais de 2.500 organizações da sociedade civil, redes de parceiros e instituições académicas e governamentais tinham subscrito o documento.
As 10 propostas da Declaração de Oviedo
Considerando as evidências existentes sobre a eficácia da prevenção e relação custo-benefício, desafiamos os países a alcançarem um consenso nacional até 2030, comprometendo-se a atribuir e manter pelo menos um quarto do orçamento total para as políticas de drogas para a prevenção. Além disso, reiteramos que as políticas devem ser proporcionalmente equilibradas entre medidas para diminuir a procura e redução da oferta de drogas, garantindo simultaneamente a saúde e a segurança públicas de todos os indivíduos, bem como os seus direitos humanos.
A prevenção deve começar o mais cedo possível e considerar os períodos a partir da gravidez, neonatal, infância e adolescência, identificando áreas prioritárias de intervenção familiar, escolar e comunitária, e continuando na idade adulta. A prevenção eficaz centra-se no fortalecimento dos fatores de proteção e na capacitação dos indivíduos ao longo da vida, nos níveis pessoal, emocional e social.
A prevenção é uma ciência. Como tal, a formulação e implementação de políticas de prevenção devem incorporar intervenções baseadas em evidências e dados, assim como mecanismos de avaliação sistemáticos orientados por padrões internacionais, em forte colaboração com o meio científico e as organizações da sociedade civil. Esta abordagem é essencial para evitar políticas de drogas baseadas em perceções e crenças erróneas. Além disso, investir na transferência da investigação e do conhecimento é de grande importância para garantir a implementação de uma prevenção eficaz em diferentes contextos sociais, económicos, políticos e culturais.
Ao centrarem-se na pessoa e não nas drogas, as intervenções preventivas têm em consideração as vulnerabilidades a nível individual e o potencial efeito protetor das estruturas sociais e do quadro legislativo que envolve a pessoa. Esta abordagem previne não só o consumo de drogas ilícitas, mas de todas as drogas em geral, incluindo o tabaco, o álcool, a cannabis, os medicamentos sujeitos a receita médica ou as novas substâncias sintéticas que são altamente prevalentes. Isto também abrangeria a prevenção de dependências sem substâncias, como os jogos de azar e a perturbação de jogos digitais.
O impacto do consumo de drogas é desigual e altamente dependente de determinantes sociais da saúde que são influenciados por vários fatores, incluindo identidades relacionadas com género, etnia, idade, orientação sexual e local de residência, entre outros. Portanto, as estratégias de prevenção devem incorporar uma abordagem holística e interseccional que aborde diferentes vulnerabilidades para permitir o estabelecimento de políticas mais equitativas e justas. Os serviços de prevenção devem reforçar todos os esforços para abranger e priorizar os grupos mais excluídos e estigmatizados, como os menores não acompanhados, as pessoas em situação de sem-abrigo, as pessoas com perturbações de saúde mental, as populações migrantes e deslocadas e os Povos Indígenas. Isto exige respostas de prevenção adaptadas às necessidades específicas de cada indivíduo em cada contexto.
Os sistemas de prevenção devem reunir diversas medidas e esforços coordenados de múltiplos setores governamentais, não governamentais e comunitários para fornecer serviços, em grande escala, para crianças, jovens e em diferentes idades de desenvolvimento. Os países devem beneficiar dos serviços de prevenção disponíveis a nível nacional e local ao alinhá-los com os padrões científicos internacionais. Portanto, deveria ser investido mais recursos para replicar modelos de prevenção que tenham demonstrado a sua eficácia e a relação custo-eficácia a nível internacional.
Em linha com uma abordagem de saúde pública, os países devem proporcionar programas de prevenção do uso de drogas que sejam acessíveis e comportáveis economicamente a todos os indivíduos em todo o mundo, a nível global e local, e interligada com a promoção da saúde, deteção e intervenção precoces, redução de danos, tratamento da dependência e integração social, numa lógica de continuidade de cuidados.
Nos países de baixa e média renda, e nas regiões que enfrentam crises humanitárias, podem faltar infraestruturas sociais básicas e de cuidados de saúde. Nestes contextos, o investimento na prevenção deve ser uma prioridade fundamental. Incentivamos a construção de parcerias sólidas entre governos, organizações internacionais, a sociedade civil e o setor privado, bem como o intercâmbio de experiências de prevenção, assim como a contextualização e localização de estratégias de prevenção com base numa abordagem de não causar danos. Também encorajamos a implementação de iniciativas para capacitar famílias, outros cuidadores, jovens e líderes comunitários.
Reconhecendo o papel fundamental dos profissionais na implementação de uma prevenção eficaz, desafiamos a comunidade educativa a incorporar a ciência da prevenção de comportamentos de risco nos currículos obrigatórios assim como na formação de profissionais da saúde, da educação e das ciências sociais. Salientamos também a necessidade de fornecer processos de certificação e formação contínua para profissionais de prevenção ao longo das suas carreiras profissionais e garantir condições de apoio para evitar o burnout.
Convidamos os países, a Comissão de Estupefacientes das Nações Unidas, a Agência das Nações Unidas sobre Drogas e Crime, a Organização Mundial de Saúde e organizações relacionadas a avaliarem adequadamente a cobertura, relevância, implementação, investimento e eficácia das políticas de prevenção de drogas nas suas jurisdições através de medidas contínuas e implementação de sistemas de vigilância e comunicação de dados e relatórios de avaliação internacional, regional, nacional e local sobre drogas ou estabelecendo monitorização ad hoc, em sólida colaboração com a sociedade civil.
Para saber mais sobre a Declaração de Oviedo, consulte o website oficial aqui.
Recorde-se que, recentemente, a Médicos do Mundo subscreveu também o “Amsterdam Manifesto Dealing with Drugs” (Manifesto de Amsterdão sobre a Abordagem da Problemática das Drogas), que defende a adoção de políticas de drogas centradas na saúde e que privilegiem a Redução de Riscos e Minimização de Danos, a descriminalização e a regulamentação dos mercados de drogas.
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