Fabrice Demoulin

A farmacêutica Novartis acaba de anunciar a retirada e pedido de revogação da patente do seu medicamento Kymriah® para o cancro. O anúncio segue-se à oposição à patente desta terapêutica genética, apresentada em Julho pela Médicos do Mundo e a Public Eye no Instituto Europeu de Patentes, com o objectivo de denunciar os preços abusivos que ultrapassam na Europa os 300 mil euros por doente.

A Médicos do Mundo (MdM), em conjunto com a organização Public Eye, apresentou, a 3 de Julho deste ano, ao Instituto Europeu de Patentes (IEP), uma oposição à patente do Kymriah®, uma terapêutica genética contra o cancro, pela qual a Novartis cobra mais de 300 mil euros por doente na Europa. O processo com vista a denunciar a patente abusiva, a qual procurava reforçar o monopólio e impor um preço excessivo, culmina agora com a retirada e pedido de revogação da mesma por parte da própria companhia farmacêutica. 

A objecção à patente teve ainda como objectivo chamar a atenção para o aumento exponencial dos preços dos novos tratamentos lançados no mercado, nomeadamente das terapêuticas genéticas para o cancro, a sua pressão nos orçamentos dos serviços nacionais de saúde e, consequentemente, no acesso aos cuidados de saúde pelos doentes. Recorde-se que, em 2014, os preços excessivos dos medicamentos para a hepatite C levaram vários governos europeus a imporem o racionamento, o que poderia também vir a acontecer com as terapêuticas celulares para cancro.
 

Vitória da mobilização da sociedade civil
 

O anúncio da retirada da patente é uma vitória alcançada pela mobilização da sociedade civil. Ao criar condições para a negociação de preços mais baixos, a Médicos do Mundo e a Public Eye pretendem reduzir o valor de todas as terapêuticas futuras deste género. Neste campo, a oposição às patentes é uma ferramenta importante e eficaz porque obriga os detentores a responder aos argumentos de quem se opõe.  

A decisão da retirada da patente do Kymriah® pelos seus detentores, a Novartis e a Universidade da Pensilvânia, nos EUA, vem confirmar a sua natureza abusiva e provar que nunca deveria ter sido concedida pelo IEP. Segundo explica Olivier Maguet, chefe da Missão para os Preços dos Medicamentos e Sistema de Saúde da MdM, “esta retirada prova o abuso dos monopólios, em particular relativamente a novas e dispendiosas terapêuticas celulares. Os Estados concordam com os preços elevados, baseados em direitos de propriedade intelectual injustificados, que nunca são questionados. No entanto, são também responsáveis por garantir que os critérios de patenteabilidade da medicação são respeitados e por não permitir patentes abusivas que custam milhões aos sistemas de saúde”

Apesar do Kymriah® estar protegido por outras patentes que não permitem a produção de uma versão biossimiliar, esta não deixa de ser uma decisão histórica. Reforça a capacidade dos hospitais públicos de produzir versões similares não protegidas pela patente a custos mínimos e assim permitir a redução do preço das terapêuticas de marca. Fortalece as instituições envolvidas na negociação de preços para conseguirem valores mais reduzidos com base em direitos frágeis de propriedade intelectual e monopólios ilegítimos. Finalmente, permitem às organizações da sociedade civil de todo o mundo o recurso a argumentos semelhantes na oposição a patentes abusivas.  

Esta decisão é a primeira de muitas, já que a Médicos do Mundo e a Public Eye pretendem levar a cabo iniciativas similares com o objectivo de reduzir preços e garantir o acesso justo aos tratamentos.

Médicos do Mundo

Médicos do Mundo
 
Médicos do Mundo
Para mais informações contactar:                                    
Jorge Sousa | jorgesousa@teller.com.pt
Telm. 917 59 62 02