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A Rede Internacional da Médicos do Mundo, em conjunto com outras organizações-não-governamentais, subscreveu uma declaração conjunta que acolhe com cautela o cessar-fogo em Gaza e exige medidas urgentes para proteger civis e garantir acesso humanitário seguro e baseado em princípios.

14 de outubro de 2025

 

A declaração, divulgada esta segunda-feira, 13 de outubro de 2025, assinala dois anos desde o início das ordens de deslocamento em massa de palestinianos em Gaza e denuncia a crise humanitária extrema provocada pelo bloqueio, pelos bombardeamentos indiscriminados e pela destruição generalizada de infraestruturas civis.

O documento alerta para a fome já instalada, para o impacto devastador sobre crianças e pessoas vulnerabilizadas, e para a necessidade de responsabilização internacional.

Exigimos ainda um cessar-fogo com garantias, o fim dos deslocamentos forçados e a restauração urgente do acesso humanitário pleno, seguro e baseado em princípios.

A declaração completa pode ser lida abaixo.

 

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Humanitários acolhem com cautela o anúncio de cessar-fogo e exigem o fim de dois anos de deslocamentos forçados de palestinianos em Gaza

 

O anúncio de um cessar-fogo representa um momento de alívio e esperança há muito esperado. No entanto, este deve assinalar o início – e não o fim – do cumprimento das responsabilidades da comunidade internacional.

Este anúncio surge num momento de crise profunda – quando a vida em Gaza se encontra à beira do colapso. A fome provocada pelo homem instalou-se devido ao bloqueio contínuo e ilegal imposto por Israel à Faixa de Gaza, colocando dezenas de milhares de crianças em risco de morte por desnutrição aguda nos próximos meses. Mulheres, homens, crianças e pessoas adultas mais velhas têm sido gravemente privadas dos elementos essenciais à sobrevivência e à dignidade, incluindo alimentos, água, combustível, abrigo e cuidados médicos.

Bombardeamentos constantes e indiscriminados mataram mais de 66.000 pessoas e mutilaram mais de 150.000 – incluindo pelo menos 21.000 crianças com incapacidades –, destruindo bairros inteiros e dizimando gerações de famílias. Milhares continuam desaparecidas sob os escombros. Mais de 92% das habitações, 518 escolas, bem como hospitais, sistemas de água, educação e meios de subsistência foram destruídos, danificados ou contaminados com engenhos explosivos não detonados.

Hoje, 13 de outubro de 2025, assinalam-se dois anos desde a primeira ordem de deslocamento em massa emitida por Israel para 1,1 milhões de palestinianos em Gaza – uma ordem que equivale a transferência forçada, um crime contra a humanidade e uma “forma de punição coletiva proibida pelo Direito Internacional Humanitário”. Em violação das obrigações legais internacionais, Israel deslocou à força e de forma repetida pelo menos 1,9 milhões de pessoas em Gaza, criando uma catástrofe humanitária em que crianças, mulheres grávidas, pessoas adultas mais velhas, pessoas com deficiência, doentes e feridos lutam para fugir, aceder a ajuda ou sobreviver em condições inseguras.

 

A transferência forçada está a ocorrer em todo o Território Palestiniano Ocupado. Na Cisjordânia, incluindo Jerusalém Oriental, milhares foram deslocados à força desde outubro de 2023, sendo particularmente alarmante o deslocamento em massa de cerca de 32.000 palestinianos dos campos de refugiados de Jenin, Tulkarem e Nur Shams, no norte da Cisjordânia, aos quais continua a ser negado o regresso.

 

No mês passado, a Comissão Independente Internacional de Inquérito das Nações Unidas sobre o Território Palestiniano Ocupado concluiu que as autoridades israelitas estão a cometer genocídio contra os palestinianos na Faixa de Gaza. Dirigentes de grandes organizações humanitárias apelaram à intervenção dos líderes mundiais na sequência desta conclusão da ONU sobre genocídio.

Estas conclusões desencadeiam obrigações legais claras para todos os Estados: agir para prevenir mais destruição, garantir responsabilização e defender as proteções garantidas pelo direito internacional.

O cessar-fogo deve estabelecer as condições para uma ação humanitária segura, baseada em princípios, e para a proteção de civis. Até à data, o acesso humanitário tem sido sistematicamente negado ou severamente obstruído, com centenas de trabalhadores humanitários e de saúde a serem alvo ou mortos. Apesar da existência de um mecanismo coordenado pela ONU, baseado em princípios, que conseguiu chegar às comunidades, apesar das inúmeras obstruções por parte das autoridades israelitas, a ajuda tem sido limitada por um modelo de distribuição militarizado e inseguro, implicado na morte de mais de 3.000 civis. Os comboios de ajuda são obstruídos, pontes e estradas foram demolidas.

Os esforços diplomáticos falharam demasiadas vezes em fazer cumprir o direito internacional ou proteger civis. O cessar-fogo deve ser a base para uma ação sustentada que restaure a proteção e o acesso humanitário, permita o regresso seguro e voluntário das pessoas deslocadas e assegure a responsabilização.

Nós, enquanto comunidade de ONG humanitárias, apelamos, por isso, a:

• Um cessar-fogo permanente e significativo, com garantias.
• Todas as partes devem proteger civis e trabalhadores humanitários e da saúde.
• O regresso seguro, voluntário e digno dos palestinianos às suas casas em todo o território palestiniano ocupado, acompanhado de uma resposta humanitária ampliada e suficiente para satisfazer todas as necessidades.
• A proteção e restauração das infraestruturas e serviços civis essenciais, incluindo sistemas de saúde, água e saneamento.
• Acesso humanitário pleno, irrestrito e baseado em princípios para organizações independentes, de forma a prestar assistência vital abrangente e rápida, incluindo alimentos, medicamentos, combustível, proteção e serviços essenciais em larga escala. Todos os pontos de passagem terrestres devem ser reabertos imediatamente e sem condições, permitindo a passagem irrestrita de pessoas e bens.
• A libertação imediata de palestinianos detidos arbitrariamente, incluindo os detidos sem acusação ou julgamento, como os que se encontram sob detenção administrativa.
• O fim da militarização da assistência e a remoção de barreiras, incluindo a recusa de registo de ONG internacionais com base em fundamentos vagos ou espúrios e a exigência de listas de pessoal.
• Todos os Estados devem cumprir as suas obrigações, incluindo o dever de prevenir novos crimes atrozes, em conformidade com o direito internacional, incluindo o Parecer Consultivo do Tribunal Internacional de Justiça (TIJ) sobre a presença de Israel no Território Palestiniano Ocupado, a Convenção sobre o Genocídio e o Direito Internacional Humanitário.
• A suspensão imediata da transferência de armas, peças e munições para Israel, para evitar a sua utilização em violações do direito internacional, em conformidade com as disposições do Tratado sobre o Comércio de Armas e conforme prescrito pela resolução da Assembleia Geral da ONU sobre o Parecer Consultivo do TIJ relativo à presença de Israel no Território Palestiniano Ocupado.
• Uma visão coletiva e transparente e uma abordagem coordenada para apoiar a reconstrução de Gaza, uma visão que deve ser impulsionada pela agência e autodeterminação palestinianas.

O Território Palestiniano Ocupado não pode ser uma exceção à lei que nos vincula a todos.

1. Abs Development organisation for woman and child
2. ACT Alliance
3. Act for Peace
4. ActionAid International
5. Action For Humanity
6. Africa Humanitarian Action
7. All We Can
8. American Friends Service Committee, AFSC
9. Asylum Access
10. CAFOD
11. Caritas International Belgium
12. Caritas Middle East and North Africa - Caritas MONA
13. Children of Earth Association- YEÇED
14. Christian Aid
15. Church World Service
16. Disable Development & Educational Foundation (DDEF)
17. DT Peduli
18. Golden Future Indonesia
19. Hayata Destek / Support to Life
20. HelpAge International
21. Horan Foundation
22. Human Initiative
23. ICVA Network Secretariat
24. IHH Humanitarian Relief Foundation
25. Insecurity Insight
26. International Blue Crescent Relief and Development Foundation
27. INTERSOS
28. Islamic Relief
29. Islamic Relief Agency (ISRA)
30. KinderUSA
31. Laznas Dewan Da'wah
32. MedGlobal
33. Médecins du Monde International Network
34. Mennonite Central Committee
35. National Foundation for Development and Humanitarian Response
36. Nonviolent Peaceforce
37. Palestinian NGO Network (PNGO)
38. Philippine Humanitarian Care (PHILCARE) Inc.
39. Qudwah Indonesia
40. Refugee Council of Australia
41. Refugee Solidarity Network
42. Refugee-Led Organization Network (RELON) Uganda
43. Rumah Zakat 44. Samaj Kalyan O Unnayan Shangstha (SKUS)
45. SEAHUM Southeast Asia Humanitarian Committee
46. Syrian Networks League (SNL)
47. Terre des hommes Foundation
48. United Against Inhumanity (UAI)
49. Women’s Refugee Commission
50. Yayasan Dompet Dhuafa Republika
51. Yemen HDPNexus Initiative
52. Yemen National NGOs Forum