A Médicos do Mundo, com intervenção junto das pessoas que utilizam substâncias psicoativas, juntou-se a mais de 300 organizações da sociedade civil europeia, para defender uma mudança na política em matéria de drogas.
O Manifesto sobre política de drogas para as eleições ao Parlamento Europeu “Por uma política de drogas que promova uma Europa mais segura, mais saudável e mais justa” é uma iniciativa promovida pela Correlation – European Harm Reduction Network e NEWNet Enjoing Safer Nightlife, que foi já subscrito também por decisores políticos de vários países.
Leia abaixo o manifesto na íntegra.
POR UMA POLÍTICA DE DROGAS
QUE PROMOVA UMA EUROPA MAIS SEGURA,
MAIS SAUDÁVEL E MAIS JUSTA
Manifesto sobre política de drogas para as eleições ao Parlamento Europeu 2024
Apesar dos milhares de milhões de euros gastos com o controlo de drogas, as políticas europeias nesta área não conseguiram proteger a saúde e a segurança das nossas comunidades.
A utilização de drogas está a atingir níveis históricos. Todos os anos entram novas substâncias no mercado europeu. As políticas de combate às drogas não conseguiram deter o crescente poder do crime organizado. A evidência mostra que a prevenção, o tratamento e a redução de riscos e minimização de danos são necessários para salvar vidas e proteger as nossas comunidades, mas faltam recursos e apoio político aos serviços para pessoas que utilizam drogas.
A eleições europeias de 2024 devem trazer uma mudança de paradigma. Este manifesto estabelece uma visão para uma política europeia de drogas pragmática, inovadora e centrada nos direitos humanos, que vai promover comunidades mais saudáveis e seguras. Convidamos todas as organizações da sociedade civil europeias, partidos políticos e candidatos a subscreverem os seguintes apelos à ação.
Juntos vamos contruir uma política de drogas que prepare a Europa para o futuro.
#FutureDrugPolicyEU24
Aumentar o investimento em cuidados de saúde e sociais
O consumo de drogas na Europa está a atingir níveis recorde e a presença crescente de novas substâncias psicoativas, incluindo os opiáceos sintéticos, fez soar o alarme. A aplicação da lei e o controlo das drogas não vão conseguir travar esta nova ameaça, da mesma forma que falharam em outras regiões do mundo. Para estarmos preparados para o futuro, as instituições da UE devem dar prioridade ao apoio e financiamento de serviços integrados de saúde e cuidados que comprovadamente funcionam. A tónica deve ser colocada em serviços que apoiem, em vez de punir as pessoas que consomem drogas, por forma a salvar vidas e manter as comunidades seguras.
A política da UE em matéria de drogas deve ser reequilibrada, colocando termo à atual ênfase em políticas de controlo da oferta, em detrimento da saúde. As instituições da UE devem aumentar o investimento e o apoio a programas de prevenção seletiva e indicada, ao tratamento voluntário centrado na pessoa e baseado em evidências, à redução de riscos e minimização de danos que salvam vidas (incluindo a prevenção do VIH/SIDA e do VHC, tratamento assistido por opiáceos, naloxona para levar para casa, serviços de testagem de drogas e salas de consumo vigiado), assim como a serviços de base comunitária ou liderados pela comunidade que possam chegar a todas as pessoas que os necessitem.
Abandonar a guerra contra as drogas
É tempo de abandonar as políticas de luta contra as drogas que, apesar de terem custado milhares de milhões de euros, não conseguiram reduzir a dimensão dos mercados ilegais de droga, travar o poder do crime organizado ou reduzir a violência. Políticas e narrativas que estigmatizam e culpam as pessoas que utilizam substâncias psicoativas e as comunidades marginalizadas devem ser substituídas por intervenções baseadas em evidências, na inclusão e nos direitos humanos.
Para garantir uma abordagem integrada, holística e intersetorial da droga, os organismos de saúde da UE devem ter um papel central na definição da política de luta contra a droga da UE. A política de combate à droga deve ser integrada nas políticas sociais, económicas e de saúde, não deve ter uma visão economicista, nem ser deixada nas mãos das autoridades que têm a cargo a aplicação da lei.
As instituições da UE devem integrar uma abordagem inclusiva no que respeita às drogas, baseada nos direitos humanos e no género, incluindo o apoio inequívoco à descriminalização das pessoas que utilizam substâncias psicoativas, como medida para eliminar o estigma e melhorar o acesso aos serviços.
A nova Agência Europeia de Luta contra a Droga deve desenvolver indicadores que controlem a eficácia e o impacto das atuais abordagens da política de combate à droga, como a prevenção da criminalidade e a redução da procura e dos danos, nomeadamente no que respeita ao estigma, ao acesso aos serviços e aos direitos humanos, e efetuar mais investigação orientada para as políticas. Os organismos da UE mandatados para defender os direitos humanos, os valores da UE e o Estado de direito devem também ser envolvidos.
Assegurar a participação da sociedade civil e da comunidade
Uma política de drogas mais segura e eficaz requer o envolvimento de organizações da sociedade civil que trabalham todos os dias com as comunidades, e que conseguem chegar às populações vulneráveis e estão mais bem informadas sobre as novas tendências nos mercados da droga. A política da UE em matéria de droga deve refletir o princípio "nada sobre nós, sem nós", envolvendo, em primeiro lugar, as comunidades afetadas e as pessoas que usam drogas.
Os mecanismos de participação da sociedade civil na política da UE em matéria de droga, incluindo o Fórum da Sociedade Civil sobre a Droga na UE, devem ser adequadamente financiados, apoiados e consultados de forma significativa pela Comissão Europeia, a Agência Europeia de Luta contra a Droga e todas as instituições comunitárias pertinentes. Estes fóruns devem incluir representantes das comunidades afetadas, incluindo as pessoas que usam substâncias psicoativas, jovens, mulheres e pessoas afetadas de forma desproporcionada pela criminalização, estigma e discriminação.
Explorar abordagens inovadoras, incluindo uma regulamentação responsável
Uma política pragmática de luta contra a droga exige a exploração de abordagens inovadoras aos mercados da droga, incluindo a regulamentação responsável de substâncias como a canábis, como medida fundamental para proteger a saúde e os direitos humanos das comunidades, e reduzir o poder do crime organizado. A UE deve facilitar estas inovações e monitorizar o seu impacto na saúde, na segurança e nos direitos humanos.
Os decisores políticos europeus devem assegurar que a legislação e as políticas europeias facilitam a adoção de abordagens inovadoras aos mercados da droga, incluindo a regulamentação responsável. A Agência Europeia de Medicamentos deve monitorizar o impacto das políticas e da regulamentação em matéria de droga, a fim de permitir o desenho de políticas baseadas em evidências. Tal irá permitir apoiar a aprendizagem mútua, aumentar a adoção das melhores práticas, contribuir para soluções pragmáticas e preparar a Europa para o futuro.